Saturday, May 17, 2008

FICÇÕES NO AR DO HUMOR

Por: Osvaldo Macedo de Sousa

Será que tudo não passa de uma ficção, de um reflexo de sombras no fundo da caverna da nossa existência, manuseadas consoante os interesses dos Diógenes no poder?
Na vida contemporânea é cada vez mais difícil discernir onde começa a ficção e acaba a realidade; onde termina o real e inicia a fantasia; onde se desenvolve o sonho e se divaga no pesadelo… porque se uns vivem nas nuvens, a maioria não consegue ver mais além do miradouro da sobrevivência quotidiana.
Será essa a realidade, a luta diária na selva da sobrevivência? Somos Homens ou bichos?
Será que os animais também têm ficções na sua vida? Se têm, não são cómicas, já que o ser humano tem o monopólio (será?) desse grão divino do riso. Bem, a hiena come merda e ri. Mas, ri de quê? Certamente é uma ironista (não uma humorista) que ri, sem saber que o faz, porque segundo os cientistas elas não têm o poder da ficção para desenvolver a inteligência da comicidade. Contudo, nunca repararam no sorriso do tubarão ou do crocodilo quando mastiga um Homem? Ou o sorriso do touro quando volteia o toureiro no ar ??… ???
Partindo do pressuposto, já que a ciência nos está sempre a surpreender com novas descobertas, que os animais não sabem ser ficcionistas, não deixam de conseguir moldar a sua existência na evolução da espécie. São criativas no “existencialismo”. Isto para não falar do animal político, um ser camaleónico, sempre em mutação, seja encarnando a grande porca (da politica), seja depenado no papagaio da retórica parlamentar, enraivecido no cão selvagem das finanças, maquiavelizado na raposa matreira das gestões publicas…. Mas isto tudo são ficções do Esopo e de La Fontaine.
Este ano o Moura BD é dedicado à temática da Ficção Cientifica porém como hoje em dia tudo é cientifico, até a politica, a apresentação da moda, a estruturação das empresas… temos alguma dificuldade em enquadrar o género humorístico nesta temática.
Todo o humorista é um ficcionista com alguma cientificidade, mas muito empirismo. É um ficcionista que na sua ingenuidade sonha com mundos melhores, com “bons selvagens” na política. Acreditam que com um sorriso nos lábios ou com a revolução de uma gargalhada desmascaram os corruptos, os caciques, os ditadores, os oportunistas. Mas tudo não passa de uma ficção nada cientifica.
Apesar disso existe um certo paralelismo entre os criadores humoristas e os criadores de ficções científicas. Ambos partem da realidade para o sonho. O sonho dos ficcionistas é a eventualidade do futuro, enquanto que o dos humoristas é a eventualidade do presente.
Ficcionar a vida é a arte dos sonhadores, voando uns para o mundo da fantasia, aterrando outros de “trombas” nas crueldades da realidade sem contudo descartarem o sonho. Quando à fantasia se associam divagações de tecnologias avançadas, a descobrir, a idealizar, então andamos por esse mundo de ficcionismo científico.
Se nos associarmos a meditações critico-filosóficas acabamos por dar o trambolhão dos incautos do riso e viajar pelo humor. Ficção Cientifica e Humorismo gráfico, curiosamente poucas vezes foram companheiras da mesma aventura, porque com o humor não se brinca….O que não quer dizer que noutras ficções mais narrativas, como a BD, literatura… o humor não tenha acompanhado as divagações futuristas dos criadores.
A ficção científica é uma criação que, partindo de um mundo real, ultrapassando-o com divagações tecnológicas, reconstrói-o no outro lado do espelho como um mundo paralelo. Esse universo fantástico, parecendo longínquo na sua apresentação, na realidade parte de fundamentos concretos, de conquistas por divulgar ou por explorar. Pela cenografia e enredo parecem fantasias futuristas extraordinárias. Quando o leitor olha para essas deambulações não procura, nem necessita de um contraponto real para os aceitar, antes navega nos novos mundos com prazer. É o campo do futurismo, de universos oníricos vestido de cenografias e figurinos extravagantes.
O humorismo, para atingir os seus objectivos parte da realidade, viaja pela ficção, mas tem de regressar com um ponto de vista reconhecível. Tem de ter obrigatoriamente um contraponto na realidade para que em contraste, em incongruência, em grotesco possa despoletar a chispa de humor e fazer-nos rir ou sorrir. O humor vive do conhecimento, da cultura do público, porque se este não estiver na mesma onda de conhecimento, não compreenderá a “graça”, não transformará a ideia em riso.
O riso é a explosão de satisfação pela realização da descoberta. É o prazer por ter conseguido seguir a lógica da ilógica do pensamento humorístico, razão pela qual tem de possuir no seu intelecto os códigos culturais, de sabedoria para os compreender.
Talvez por isso, o humorista tenha alguma dificuldade em fazer humor com as ficções científicas, já que essa via os obriga a ter conhecimento profundo sobre essa matéria, para poderem ter um distanciamento critico-cientifico humorístico para brincarem com dignidade com o assunto. Por outro lado ele necessita também de ter presente até que ponto o público domina, e compreenderá as suas deambulações ficcionais. Finalmente, é necessário que o público tenha a cultura suficiente, não só para compreender, mas sobretudo para encontrar a dimensão humorística. Se compreender, mas não encontrar a linha que o desenhador elaborou pelo grotesco, então é um fracasso no âmbito da comicidade. O público terá que ter a mesma dimensão de conhecimento para a paródia, a alegoria, ou o humor resultar.
Enquanto na literatura, na narrativa gráfica, ou mesmo na ilustração os devaneios ciêncio-futuristas são enquadrados numa ficção especial, com pormenores explicados ao correr da pena, no humor gráfico de uma imagem simples e imediatista, não é possível dar explicações extras ao público para que ele compreenda a síntese. Sim, de síntese se trata o humor gráfico, uma imagem que vale milhares de palavras mas apenas para quem as saiba escutar nos espaços, para quem saiba ler nas entrelinhas.
As confluências que iremos encontrar ao longo da história entre o humor e a ficção científica estão ligadas aos avanços tecnológicos reais, ou desejados, que se tornam míticos por se considerarem como sonhos com aparência do inatingível para o comum dos mortais.
As primeiras ficções humanas deste género são portanto oníricas, e apesar de hoje podermos encará-las como cientificas e até humorísticas pelo seu grotesco, na época eram mais a sombra dos pavores que dominava a alma da sociedade, o pavor pelo desconhecido, pelo infindável do universo. Falo dos monstros fantasiados pelos marinheiros, pelos descobridores e aventureiros que tentavam ir mais além dos mundos conhecidos, dos seres fantásticos desenhados no mapa-múndi. São figuras ditas cientificas do “fim do mundo” ou mitológicos que acabaram por não corresponder à realidade.
Se na térrea visão havia pesadelos fantasistas, no céu onde viviam os deuses, donde podia cair todas as fatalidades do desconhecido, criou-se um campo ainda maior de futurismos e extravagancias cientifico-fantasistas. Desde muito cedo a mente humana voou pelos espaços infindáveis à procura dos sonhos, de razões filosóficas para a nossa existência, para a nossa triste vida.
O espaço passou a ser, para além das estrelas onde estava escrito não só o nosso passado como o nosso futuro, também a casa dos deuses, o caminho donde viemos, ou donde poderão vir outros mundos. Aí se instalaram os céus divinos. Dai se descreveram a chegadas de carros de fogo com seres extraordinários. Para aí tentou caminhar Ícaro com suas asas de cera. Para aí se idealiza o inicio de uma relação em “Lua de Mel”.
A fantasia dos humoristas gráficos da idade contemporânea viajou nos astros, idealizou personagens mecânicos, parodiou a vida, não como uma ficção científica, mas como uma ciência ficcionada.
As duas primeiras provocações, com que se confrontaram no âmbito das tecnologias foi com a máquina a vapor e com a máquina fotográfica.
O vapor, apesar de já ser conhecido desde a Idade Clássica em engrenagens “divinas” e brinquedos desenvolvidos pelos Gregos, foi esquecido durante séculos para só vir revolucionar a sociedade no séc. XIX.
Aquando do desenvolvimento da caricatura já o vapor estava implantado na sociedade ocidental, mas continuava a parecer, aos olhos incrédulos do povo como uma máquina diabólica saída da mente de cientistas loucos. O mesmo acontecerá com os primeiros carros, invenções assassinas criadas apenas para atemorizar os homens de boa fé. Só com o tempo, e através da experiência da utilidade destas máquinas, essas criações deixaram de pertencer ao mundo mitológico da ficção científica, para se banalizar no quotidiano e não se passar sem a sua existência.
Em relação á exploração do mundo com uso e abuso das máquinas, Júlio Verne será um escritor extraordinário que não só familiarizou os leitores com a ficção científica, como instruiria a sociedade das potencialidades das máquinas. Portugal, apesar do alto nível de analfabetismo no séc. XIX, estava sempre a par das novidades literárias europeias, principalmente francesas, e apesar de poder não ser compreendido pela maioria dos leitores, Raphael Bordallo Pinheiro acabará por fazer uma alusão ao livro “Volta ao Mundo em Oitenta Dias” de Júlio Verne em 1883, com um desenho comentário. Génio da ficção cientifica, Verne encontrou em Raphael um apreciador, pelo menos desta aventura.
Quanto à máquina fotográfica, era uma engrenagem diabólica que enclausurava as almas num papel; era uma caixa mágica que vinha alterar profundamente a visão do mundo. Deu uma nova perspectiva do espaço, encurtando distâncias, já que colocava uma paisagem, uma personagem, uma cultura que se situava a milhares de quilómetros, á distância de um simples olhar. Dessa forma se desmistificou seres, revelou culturas, criou novas perspectivas do já conhecido… Essa caixa mágica que desconstruiu ficções, criando outras; que descarnou a realidade crua; que revelou mundos exóticos ou fantasistas mais parecia a criação de um irreverente caricaturista, do que o resultado de investigações tecnológicas. É verdade que Nadar, um dos grandes pioneiros da fotografia era também caricaturista do desenho que procurava novas visões do mundo através das tecnologias, que procurava fixar o momento instantâneo do mundo como registo de um presente que passa rapidamente e se transforma em passado num piscar dos olhos.
Em Portugal, de imediato, houve alguns indivíduos que se equipararam com tecnologia para também eles divagarem pela imagem do nosso povo, da nossa terra. Raphael Bordallo Pinheiro, o grande mestre do jornalismo e da caricatura em Portugal (que este ano comemoramos o centenário do seu falecimento) não possuía nenhuma destas máquinas. Era um humorista irreverente, que retratava satiricamente a sociedade, que explorava o retrato-charge para fixar em ironia os políticos e demais homens que se destacavam para poderem pertencer ao álbum das glórias nacionais. Era um indivíduo incómodo para o poder porque “retratava” de forma grotesca os governantes, razão suficiente para as Finanças, sedenta de impostos, o cadastrasse não como artista, ou jornalista, mas como retratista fotográfico. Retratistas eram indivíduos possuidores de máquinas fotográficas (na altura não eram de bolso mas enormes). Quem tem máquinas para o seu trabalho é porque é um industrial. Quem é industrial tem que pagar impostos como tal, como empresário. Por essa razão Raphael, o retratista-charge dos governos tinha que pagar impostos como retratista fotográfico, mesmo que não usasse ou não possuísse tal máquina que roubava as almas, o fácies político.
A fotografia era algo que atemorizava os Homens incrédulos cientificamente, encarando essas máquinas como diabólicas. Porém por mais ficções que tentassem desenvolver á sua volta, ela só queria ser um instrumento de registo dos momentos, dos eventos, das viagens. Rapidamente se assumiu como peça importante do jornalismo, não só como técnica de registo, como logo a seguir como técnica de impressão na imprensa.
Nadar, que também tinha a obsessão do espaço, levou a sua máquina para o céu de Paris, juntando duas fantasias do Homem, a imagem e o espaço. As viagens deram espaço a essas ficções que tinham por comum o termo viação, acrescentando-lhe também o “a”, em aviação. Os carros, os aviões dominaram a velocidade das mentes criativas, que do Balão conseguiram passar para o aeroplano, recuperando o ar insuflado nos Zepelins, passando pelo avião, o helicóptero, o foguetão.
A Guerra não é uma ficção, é uma tragédia que o Homem leva colada ao seu ADN. A única forma do ser humano sair desse atoleiro da animalidade política, é pela irreverência do riso, é divagar sobre a loucura com a loucura do grotesco. Seja pela via do Dadaismo, surrealismo, abstraccionismo… a alma artística foge á anárquica realidade, para criar um novo mundo de anarquia estética onde se possa ainda sonhar com a salvação da humanidade. Essas irreverências estéticas acabam sempre por possuir o riso dentro de si, de forma assumida como humor, seja em ironia disfarçada. Os intelectos que recusam o humor, defendendo a seriedade da arte pela arte, mais não fazem que usar a má comicidade dos objectos, dos seres, das cores para fingirem que acabaram de descobrir o indescobrivel. A todos esses está reservado o reino dos céus naif, nesta sociedade humorística, em que se transformou a Idade contemporânea.
Quem segue a via do humor, sem medo, sem vergonha, com ousadia e irreverência lhe está designado o inferno do quotidiano. È com ele que o artista trabalha e para quem trabalha.
Dentro dos ficcionistas gráficos, aqueles que desenvolvem a narrativa ainda podem sonhar com “Super-Heróis” que nos vêm salvar de todas as ameaças dos “homens maus”. Aqui a ficção cientifica é um campo de girassóis florescente, mas quando o humorista descarna a realidade, demonstrando quão grotesco é o ser humano, não há super que nos valha, apenas uma boa gargalhada na cara do perigo. Sempre é melhor rir que cuspir, para nos defendermos do vento.
Após o dilúvio de cuspidelas, dizem que vem a bonança. Após a destruição total, virá algo mais? Claro, mais não seja as máquinas que substituem o Homem e nos dão tempo para desfrutar a vida.
O Robot, esse ser “maravilhoso” que faz tudo por nós é um sonho que se tornou realidade, depois de tantos anos como simples ficção científica. Já se falavam dessas máquinas nos tempos dos Gregos Clássicos, que ajudavam os homens da religião a manter ilusões divinas. Máquinas que poucos conheciam, mas que faziam mexer os mecanismos milagrosos dos oráculos.
Com o séc. XIX, a Revolução Industrial, o Robot renasce como ficção, mas também como realidade que tem sido construída lentamente por experimentalismo. As máquinas souberam crescer, souberam conquistar memórias, inteligência… mas ainda estão sob controlo humano, porque ainda não tem autonomia criativa.
Esse dom ainda pertence ao Homem, e de inventores todos temos um pouco. Uns inventam desculpas por chegarem tarde ao trabalho, a casa com ficções tão cientificamente estudadas que logo se desmascaram. Outros inventam formas de estar no emprego, sem trabalhar, ou mesmo de não pôr lá os pés. Outros formas de tornear a vida com facilidades.
Stuart Carvalhais foi um deles, um artista que de tanto “mentir” sobre a vida, se tornou um dos maiores humoristas do séc. XX. Ele inventou quão filosófica pode ser a vida dos “perdidos na vida”; quão poética pode ser um simples caminhar de varinas; quão séria é a queda de um bêbado, ou o desespero de um genro… Fez da vida quotidiana uma grande ficção científica.
Nesta efervescência de fantasias humorísticas que Portugal tem a felicidade de ser prolífero, já que somos um povo de inventores, de desenrascadores, de improvisadores do quotidiano poderíamos falar em muitos mais criadores humoristas, mas alma paralela de Stuart temos um Francisco Valença. Um homem que de tanto trabalhar a arqueologia (como desenhador técnico) via melhor o futuro com um sorriso no presente. Subjugados aos olhares censórios do regime, foram grandes ficcionistas que com a cientificidade do humor souberam criar novos mundos de humor, dentro do mundo corriqueiro que era a simples sobrevivência sob a ditadura da tristeza. Para tudo havia solução no riso ou sorriso, desde a segurança viária, como a segurança de pensamento.
Foram tempos em que a ficção política não se podia desenvolver, por questões de segurança de estado, não fosse um humorista inventar que se poderia governar em democracia. Foram tempos em que foi posta em risco o futuro da inteligência humana, em que as mentes foram obrigadas a rir-se nas entrelinhas da ficção anedótica,
O futuro da humanidade depois de tudo terem descoberto no planeta terra (ou pensarem que tudo conheciam), o Homem voltou a dirigir o seu olhar para os céus à procura do que os astros lhes reservavam. Não satisfeitos com as previsões dos astrólogos que são semelhantes ás previsões do tempo, resolveram dar mais apoio aos astrónomos. Novos territórios havia para conquistar, e se não se conseguia ver, pelo telescópio, “índios” na lua, de certeza que eles por ali andavam escondidos, emboscados bem perto para nos assaltarem. De certeza que o Planeta Marte seria o local ideal que qualquer estratega usaria como base de invasão.
Se o Planeta era vermelho para se distinguirem melhor, de certeza que deveriam ser verdes. Teriam orelhas de corneta, porque passavam o tempo a coscuvilhar as conversas da terra… Mas afinal quem são os humoristas, os da ficção científica ou os contadores de anedotas? Alem disso as suas naves não podiam ser como as nossas, já que pertencem a civilizações mais avançadas e, como toda gente sabe, o que fez andar a civilização foi a roda, então suas naves seriam redondas como a roda, para rodarem mais rapidamente pelo espaço. È certo que para além da roda, o que o povo menos conhece mas que tenta diariamente descortinar no universo da sobrevivência, são as moedas, esses objectos redondos que rapidamente voam dos nossos bolos.
Foram então décadas de obsessão por marcianos, por invasões do espaço sideral alimentadas por relatos de visões de luzes estranhas que possuíam velocidades astronómicas, que nos vigiavam nos momentos mais conturbados da nossa história, para além dos relatos de navios e aviões desaparecidos no triangulo das Bermudas. Perante o desconhecimento, perante tantas dúvidas nada como enfrentar os medos com o riso e contar umas boas anedotas sobre o caso. Os estúpidos, os grotescos passaram a ser os extra-terrestres no imaginário anedótico.
Eram tempos em que as Nações mais desenvolvidas tecnologicamente começaram a corrida para o espaço, não só por questões de orgulho nacionalista, como por sonharem com a conquista de novos territórios, novas colónias espaciais. A ganância por vezes dá seus frutos científicos, já que para se ganhar dinheiro é necessário investir dinheiro, e da impotência de se levantar um foguete para além da atmosfera, se ultrapassou para além da estratosfera. Duas potências correram contra o tempo para serem os primeiros, já que o segundo é do grupo dos últimos. Depois dos foguetões, vieram os satélites…
O primeiro satélite lançado no espaço foi obra dos soviéticos. Foi baptizado como “Sputnik”, o qual passou a poluir o espaço com um “bip, bip…” constante que incomodou por muito tempo o sonho americano, nesse pesadelo de ser sempre o segundo. Contudo no imaginário do povo esse “bip, bip”, teria muito mais força que uma simples bola a girar á volta da nossa cabeça, era algo mais profundo e em Portugal de imediato passou a pertencer á gíria popular como símbolo de supositório. Se estava doente nada como um sputnik pelo rabo acima. O supositório também era um objecto de ficção científica, pois para muitos não compreendiam como uma coisa que entra por onde se deita fora, possa curar doenças que se situam noutros espaços mais nobres.
Depois da era de Marte, depois de se esgotarem as anedotas marcianas, este tema criativo esmoreceu, renascendo o eterno fascínio por aquela rocha ambulante que tem feito sonhar a humanidade ao longo dos séculos, a Lua. Não bastava olha-la na sua distancia tranquilizadora. Não bastava temer o seu desaparecimento periódico, ou ela influenciar os períodos terrestres. Era necessário ir lá, se possível enterrar a bandeira da nação para reivindicar a sua posse, para mais tarde recordar, já que ainda não é possível urbaniza-la. Foi um pequeno passo do homem Armstrong, um grande passo para a humanidade que se concretizou em 1969. Ainda hoje há muita gente que não acredita que já lá estivemos, e que o que se vê nas televisões mais não é que uma montagem de Hollywood, uma criação da ficção cientifica.
Nesta corrida entre americanos e soviéticos acabaria por ser ganha pelos americanos, após terem sido sempre segundos no lançamento do primeiro satélite, no envio de um animal para o espaço e de por um Homem em orbita.
A forma da Lua, a sua composição, o que ela tinha no lado escondido, os fatos espaciais, os foguetões foi um mar turbulento para a imaginação fantasista dos humoristas, que se aproveitaram para descarregar suas ideias e dessa forma preencher as páginas vazios dos jornais que lhe pagavam para terem graça e divertirem o povo stressado com a conjuntura politico económica, obcecado pelas dificuldades da sobrevivência económica do Jet7… Em Portugal foi essencialmente importante, já que dava uma aragem nova ás corriqueiras anedotas de bêbados e sogras, temática em que tinha caído o nosso humor gráfico: Viviam-se tempos de ditadura, de censura em que a politica governamental, ou a sátira social sobre a miséria e exploração eram proibidas.
Apesar de tudo, poder-se-ia ter explorado mais este filão, só que como a cultura espacial do nosso povo e dos próprios humoristas era muito limitada, também não seria muito conveniente entrar demasiado nesse mundo desconhecido, não fosse cair no buraco negro da PIDE que veria entre linhas o incentivo a Super Novas…
Em 1974, com a revolução para a Democracia, os caricaturistas tomaram posse de novos mundos políticos, preferindo outras estrelas de pés de barro que povoam a constelação das nossas desgovernações. È a era do fundamentalismo político, ou futebolístico, em que nada mais interessa ao Homem. Foram tempos de novas naves cruzarem os nossos ares, tempos de sonharmos com outras ficções científicas, tempos de sonharmos com Super-Herois que nos salvassem dos pesadelos quotidianos, que nos salvassem destes “homens maus”…
Ainda não conseguimos acordar desse pesadelo, sair da Guerra das Estrelas, contudo o cansaço de olhar sempre para os mesmos asteróides sem brilho, outros interesses se desenvolveram e o humor procura de tempos a tempos retratar outras vivências, outras existências.
Hoje o espaço está de novo no interesse social, não só porque a Europa também tem o seu projecto espacial, como Portugal está integrado nas forças científicas que o desenvolvem. Inclusive já temos o nosso satélite. A grande maioria não sabe para que serve, mas temos muito orgulho nele.
Quanto a ficções cientificas isto está cada vez mais difícil, porque a velocidade da luz é tão estonteante, que mal fechamos os olhos já temos novas realidades, seja nos telemóveis, nos computadores, nas novas naves que cruzam o espaço, nas novas armas que nos destroem… contudo nada trava a mente humana e há sempre algo mais além, pelo menos um sorriso de condescendência pela pequenez do Homem perante o Universo.
Pelo sorriso o mundo pula e avança, como um planeta colorido nas mãos dos humoristas. Enquanto soubermos rir das nossas desgraças, das nossas ficções e fixações poderemos pensar que há esperança para esta humanidade da terra, porque de outras humanidades noutros planetas eles que se preocupem com isso.
A nossa preocupação é mesmo saber se tudo isto que nos rodeia é mesmo uma anedota. Será que tudo não passa de uma ficção política, e a realidade cientifica não passa de um shoping-center onde nos perdemos sob o poder de um cartão de crédito? Será que a América existe e nós apenas somos uma sombra na caverna de Platão? Será que o “Super-homem” existe e o que vimos cruzar o céu, não é nem um pássaro nem um avião? Será que…

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